Quem mora em grandes centros urbanos já deve ter visto cena semelhante: em vias ao lado de linhas de trem ou de metrô ônibus circulam com seus passageiros no mesmo trajeto. E, muitas vezes, nenhum dos dois está lotado.
Bom para o usuário, que tem a opção de embarcar no modal que desejar, a cena é apontada como um dos problemas do sistema ferroviário no país, por dividir passageiros com outros meios de transporte.
Esse ponto é um dos oito que constam num documento lançado pela ANPTrilhos (Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos), com apoio de entidades como a FNP (Frente Nacional de Prefeitos), o Consetrans (Conselho Nacional de Secretários de Transportes) e o Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes de Mobilidade Urbana.
Intitulado “O Futuro da Mobilidade – A contribuição do transporte público sobre trilhos para uma nova mobilidade urbana”, o documento prega que, além do fim da sobreposição entre modais de transporte, as cidades desenvolvam medidas como planejamento de longo prazo e gestão centralizada para toda a região metropolitana, e não apenas para a principal cidade da região.
Esse problema da sobreposição é facilmente encontrado, por exemplo, no Rio de Janeiro, onde ônibus percorrem rotas em longas avenidas paralelas à via férrea operada pela SuperVia, concessionária que administra 270 quilômetros do sistema ferroviário no Rio e em outras 11 cidades da região metropolitana.
Outras preocupações do setor são priorizar a integração do transporte, o financiamento do transporte público coletivo pelo transporte individual, instrumentos de financiamento de situações de emergência (como a pandemia da Covid-19), o financiamento de gratuidades e a colaboração do poder público com os sistemas de transporte em períodos emergenciais.
Presidente da ANPTrilhos, Joubert Flores disse que o lançamento do documento num momento como esse se deve ao fato de a pandemia ter alterado as relações de trabalho, com a previsão de manutenção de parte dos funcionários das empresas no regime de home office.
“A experiência do trabalho remoto está se mostrando vantajosa para as empresas, com a diminuição dos seus custos fixos, e para as pessoas, com o aumento da qualidade de vida. Diante deste cenário, o transporte público foi fortemente impactado e não recebeu auxílio governamental, diferente de outros setores que receberam apoio para manter suas atividades”, disse.
De acordo com a associação, é preciso que os governos deem importância ao planejamento adequado e integrado do transporte.
O documento surge num momento em que trens e metrôs bateram recorde negativo de passageiros transportados no país, por conta da pandemia da Covid-19.
De cerca de 11 milhões de passageiros transportados por dia útil em 2019, o total caiu para 5,8 milhões no ano passado, segundo relatório da ANPTrilhos.
Com isso, a queda na quantidade de passageiros que utilizaram os sistemas em 2020 chegou a 46,7% em comparação com o ano anterior, a maior redução já registrada.
Só na SuperVia, a perda financeira foi tão grande que a empresa pediu recuperação judicial. Deixaram de ser transportados mais de 100 milhões de passageiros desde o início da pandemia.
A redução na demanda, segundo a associação, gerou perdas de R$ 8 bilhões em receita tarifária entre março e dezembro.
O objetivo do documento, diz a associação, é apresentar propostas e soluções para que gestores avaliem as medidas adequadas de mobilidade às diferentes realidades existentes no país.
“A redução do número de passageiros no transporte público não é necessariamente uma novidade. Desde a década de 90, o setor vem sentindo a queda, que tem sido acompanhada pelo aumento acelerado da frota de veículos de uso individual, puxado pelas políticas de incentivo à indústria automobilística”, disse, após o lançamento, a diretora-executiva da ANPTrilhos, Roberta Marchesi.
Há em operação 1.116,5 quilômetros de trilhos no país, com 48 linhas e 627 estações.
As concessionárias atendem 71 municípios de 10 estados e o Distrito Federal e estão presentes em quatro das cinco regiões brasileiras: Sul (Rio Grande do Sul), Sudeste (São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais), Centro-Oeste (Distrito Federal) e Nordeste (Bahia, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará).
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