A inauguração da São Paulo Railway na segunda metade do século 19 contribuiu para transformar um país até então essencialmente rural num que passou a se industrializar.
Essa é uma das afirmações apresentadas no minidocumentário “A Influência Britânica no Desenvolvimento do Setor Ferroviário Brasileiro”, lançado há exatamente um ano pelo governo britânico e que mostra os impactos na economia brasileira provocados pelos investimentos ingleses nas ferrovias, principalmente a São Paulo Railway.
O minidoc já foi tratado no Sobre Trilhos no ano passado, mas a celebração de um ano do lançamento leva novamente à reflexão sobre os motivos de o país ter deixado de investir em ferrovias no passado.
Primordial para o escoamento da produção agrícola, leia-se café, até o porto de Santos, a São Paulo Railway acelerou os investimentos e originou o surgimento de dezenas de companhias ferroviárias, que com o passar do tempo foram ficando obsoletas e acabaram falindo ou incorporadas a outras empresas.
Foi assim, por exemplo, que surgiu em 1971 a Fepasa (Ferrovia Paulista S.A.), fusão das companhias Mogiana, Paulista, Sorocabana, Araraquara e São Paulo-Minas.
Um exemplo de como a ferrovia contribuiu para o escoamento da produção agrícola é a rota que era feita pela Companhia Mogiana de Estradas de Ferro entre Campinas e Ribeirão Preto.
A distância percorrida entre as estações principais das duas cidades era de 317 quilômetros via ferrovia. Hoje, pela rodovia Anhanguera, o trajeto é de pouco mais de 220 quilômetros.
Os 97 quilômetros adicionais se devem a fatores como a topografia, mas também a desvios feitos para buscar café nas propriedades rurais. Muitas vezes, os próprios fazendeiros bancavam a construção de estações, que hoje seriam chamados de entrepostos, para conseguir exportar o café.
Até então, o transporte era feito no lombo de animais, então imagine o ganho de eficiência provocado pela chegada do trem.
Entre os benefícios da chegada dos ingleses às ferrovias brasileiras está a transferência de tecnologia da época, como a engenharia utilizada para romper a Serra do Mar.
O vídeo britânico, de cerca de 17 minutos, mostra também como o monopólio dos 139 quilômetros de trilhos sob concessão da SPR entre Santos e Jundiaí fizeram com que, durante todo o período da concessão, de 90 anos, ela fosse a mais bem sucedida companhia ferroviária em atuação no país.
Até o fim da concessão, em 1946, ela permaneceu como empresa britânica e, depois, foi administrada pelo governo federal (ferrovia Santos-Jundiaí).
A importância do capital estrangeiro, sobretudo inglês, no desenvolvimento das ferrovias brasileiras já tinha sido apontado por outros estudiosos, como fez o brasilianista William Summerhill no livro “Trilhos do Desenvolvimento: Ferrovias no Crescimento Econômico Brasileiro 1854-1913”.
Professor na Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA) e pesquisador de história econômica brasileira, ele mostrou que os investimentos ferroviários foram o que de mais importante aconteceu no Brasil na segunda metade do século 19 e tiveram papel primordial para o crescimento econômico do país.
Além da SPR, com capital inglês se desenvolveram companhias ferroviárias como a Paulista, que buscou empréstimo em Londres para pagar a implantação do ramal ferroviário até Mogi Guaçu.
O vídeo apresenta entrevistas com pesquisadores brasileiros e membros do governo britânico e começa na estação da Luz, que é vista pelos ingleses como uma ótima representação da parceria entre o Reino Unido e o Brasil.
Fonte: Folha de São Paulo, 20/07/2022
Foto: Eduardo Knapp-12.jul.21/Folhapress