Concessões de ferrovias ficam para próximo governo

Promessa da presidente Dilma Rousseff em 2012 para destravar a economia, boa parte do Programa de Investimentos em Logística (PIL), incluindo praticamente todas as concessões de ferrovias e portos, terá de ser tocada pelo próximo governo, em um total estimado em 120 bilhões de reais em investimentos pendentes.

A pouco mais de três meses do fim do atual governo, a maior parte dos objetivos iniciais do PIL em rodovias e em aeroportos foram atingidos, mas nenhum projeto envolvendo concessões de ferrovias e arrendamentos de áreas em portos públicos saiu até agora, devido a problemas burocráticos ou mesmo dificuldades para atrair investimentos privados.

“Essa agenda ficou muito a desejar. Tudo o que andou e deve andar é a área de rodovias e ainda assim perdeu-se muito tempo discutindo a taxa de retorno dos projetos”, disse o economista Fernando Camargo, da LCA Consultoria. Na sua opinião, a competição nos leilões se encarrega de reduzir a taxa de retorno. “O governo não precisa se preocupar com isso.”

Dentro do governo, acredita-se que apenas um trecho de ferrovia, que liga Lucas do Rio Verde (MT) e Campinorte (GO), tem alguma chance de sair em 2014. O investimento estimado para o trecho de 880 quilômetros é de cerca de 5,4 bilhões reais.

Em portos, o processo envolvendo o primeiro bloco de licitações, de arrendamento de um total de 29 áreas em terminais no Pará e no porto de Santos, está tramitando do Tribunal de Contas da União (TCU) há quase um ano e ainda aguarda aprovação.

“Dependemos do tribunal. Nós fizemos todas as gestões possíveis”, disse à Reuters o ministro-chefe da Secretaria de Portos, César Borges.

Segundo ele, a secretaria tem plenas condições de publicar o edital imediatamente após uma eventual liberação por parte do TCU. “Estamos preparados. A gente não fecha nem os olhos. Autorizou, nós publicamos”, disse.

Apesar de tantos projetos que vão ficar para os próximos anos, o ex-diretor da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) Luiz Afonso Senna não vê risco de haver um recuo na política de concessões.

“As três principais candidaturas –Dilma Rousseff (PT), Marina Silva (PSB) e Aécio Neves (PSDB)– compartilham essa ideia das concessões, com mais ou menos intensidade, mas é um consenso a importância das concessões”, disse Senna.

Será também crucial para o próximo governo resolver outra questão, independentemente de quem seja eleito: a retomada da confiança do mercado no governo, principalmente na condução da política macroeconômica, avaliou o economista Fernando Camargo, da LCA.
“A agenda macro tem de passar a dar mais confiança para o mercado. Por outro lado, na agenda micro, o governo também precisa confiar mais no mercado para chegar a seus objetivos de ter investimentos com tarifa baixa”, disse Camargo.

FERROVIAS E PORTOS

O TCU liberou o processo da ferrovia entre Lucas do Rio Verde e Campinorte em fevereiro deste ano, mas diante de incertezas sobre interesse dos investidores, o governo federal ainda não publicou o edital.

Mesmo que esse leilão ocorra este ano, ficarão para o próximo governo as concessões de outros 14 trechos de ferrovias previstos no PIL, que somam 10,7 mil quilômetros de extensão e devem exigir, segundo estimativas preliminares, um total de cerca de 85,5 bilhões de reais em investimentos.

Para destravar esse processo, a principal missão do próximo governo, segundo especialista em logística, é reduzir a percepção de risco dos investidores em relação ao novo modelo de concessões de ferrovias.

“As ferrovias demandam investimentos de peso. A percepção é de que o risco é alto (…). A incógnita é a capacidade da Valec exercer esse novo papel, ao qual ela não está acostumada. O próximo governo precisa resolver isso”, disse Senna.

O novo modelo de concessões para o setor prevê que a estatal Valec compre toda a capacidade de carga das futuras concessões de ferroviárias para revendê-la a outras empresas que queiram operar trens nas novas vias.

Para portos, nem dentro do governo acredita-se que ainda seja possível fazer algum arrendamento de área em portos públicos ainda este ano, segundo disse uma fonte que pediu anonimato.

Com isso, deve ficar para a próxima administração licitar quatro grandes blocos de arrendamentos, com investimentos totais de cerca de 17,2 bilhões de reais.

O governo federal esclareceu 15 de 19 questionamentos do TCU sobre os arrendamentos do primeiro bloco, e entre as quatro que restaram, a principal é a cobrança do Tribunal do estabelecimento de tarifas-teto para todos os serviços.

O julgamento do recurso do governo sobre esses quatro itens foi interrompido em julho e ainda não há previsão sobre quando o caso voltará à pauta do tribunal.

Existe ainda uma dificuldade adicional, que barraria o lançamento do edital portuário mesmo se o TCU aprovar o recurso do governo contra os quatro questionamentos. Trata-de de recurso apresentado por parlamentar que questionou o TCU por ter aceitado as explicações do governo federal sobre as 15 primeiras exigências. O mérito do recurso ainda não foi julgado.

O ministro César Borges destaca que o fato do primeiro bloco de licitações ainda não ter sido aprovado pelo tribunal afeta também os trabalhos para os outros lotes de arrendamentos.
“Queríamos já fazer a consulta pública do segundo bloco, mas essa consulta depende da posição sobre o bloco 1, das adaptações que forem necessárias”, disse o ministro.

Borges ressalta que apesar do atraso dos arrendamentos, a secretaria já conseguiu avanços em outra frente, a de autorizações para Terminais de Uso Privado (TUPs), fora dos portos públicos.
Desde o final do ano passado já foram autorizados 26 novos TUPs e expansão de outros dois. “Esses terminais terão cerca de 10 bilhões de reais de investimentos”, disse Borges.

RODOVIAS

Após o fracasso inicial do leilão da BR-262 (ES-MG) em setembro do ano passado, que não teve interessados, o governo federal conseguiu realizar o leilão de seis outras rodovias.

Em janeiro deste ano, foi lançado um novo pacote para mais cinco concessões rodoviárias, com investimentos totais de 17,8 bilhões de reais. Inicialmente, a intenção era publicar todos os editais no segundo semestre deste ano.

Mas, deste novo pacote, apenas uma concessão, a da ponte Rio-Niterói, que prevê investimentos de 600 milhões de reais, tem alguma chance de ser realizada este ano. “Se não for possível, talvez o edital saia ainda este ano e o leilão ocorra no começo de 2015”, disse uma fonte do governo federal a par do assunto.

Este leilão, em particular, tem um motivo a mais para ocorrer o quanto antes, já que em maio vence o atual contrato de concessão da ponte, hoje administrada pela CCR.

Caberá ao próximo governo, portanto, levar adiante as concessões de cerca de 2,6 mil quilômetros dos outros quatro trechos rodoviários já lançados e cujos estudos ainda estão em andamento.

Fonte: Reuters, 26/09/2014  

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